Eletrólito sólido de lítio
Um novo tipo de bateria combina a capacitância e a resistência negativas dentro de uma mesma célula, permitindo que a célula se carregue sem perder energia.
Isso tem implicações importantes para o armazenamento de energia a longo prazo e para dar melhor potência de saída para as baterias, cuja tecnologia tem ficado virtualmente estacionada há anos.
Maria Helena Braga e seus colegas das universidades do Porto (Portugal) e do Texas em Austin (EUA) fabricaram sua bateria muito simples usando dois metais diferentes como eletrodos (alumínio e cobre), e um eletrólito vítreo de lítio ou sódio entre eles.
“O eletrólito de vidro que desenvolvemos era rico em lítio, então eu pensei que poderíamos fabricar uma bateria na qual o eletrólito alimentasse os dois eletrodos com íons de lítio, carregando e descarregando sem a necessidade do lítio metálico,” contou Helena.
Uma das vantagens é que a dispensa do lítio metálico e dos eletrólitos líquidos descarta a formação dos dendritos, as pequenas “agulhas” que se formam nas baterias de lítio e fazem-nas parar de funcionar – ou pegar fogo. Outra vantagem é que essa bateria pode funcionar até temperaturas muito baixas (-35 ºC), o que tem sido um problema para os carros elétricos nos países de clima mais frio.
Helena e seus colegas sugerem que essas baterias podem ser usadas em comunicações de frequência extremamente baixa e em dispositivos como luzes piscantes, bipes eletrônicos, osciladores com controle de tensão, inversores, fontes de alimentação comutadas, conversores digitais e geradores de funções e, com mais desenvolvimento e maior capacidade, para alimentar aparelhos eletrônicos e carros elétricos.
Célula eletroquímica
A principal inovação está em deslocar a capacidade de armazenamento de energia da bateria para o anodo, em vez do tradicional catodo, através do eletrólito sólido de vidro.
Isto é significativo porque unifica a teoria por trás de todos os dispositivos de estado sólido – como baterias, capacitores, energia fotovoltaica e transistores -, nos quais os diferentes materiais em contato elétrico apresentam as propriedades do material combinado, em vez das propriedades dos materiais individuais.
“Quando um dos materiais é um isolante, ou dielétrico, tal como um eletrólito, ele altera localmente sua composição para formar capacitores que podem armazenar energia e alinhar os níveis de Fermi no dispositivo,” explicou Helena.
Em uma bateria, a diferença de potencial do circuito aberto entre os eletrodos se deve a uma necessidade elétrica de alinhamento dos níveis de Fermi, uma medida da energia dos elétrons mais livres em um sólido, que também é responsável pela polaridade dos eletrodos. As reações químicas ocorrem mais tarde, e são alimentadas por essa energia potencial elétrica armazenada nos capacitores.
Assim, a capacidade de armazenamento de energia da célula depende não só das reações eletroquímicas, como nas baterias convencionais, mas também do armazenamento eletrostático – como nos capacitores -, o que dá origem a uma bateria muito segura.
“Nossas células eletroquímicas, que em princípio são mais simples do que as baterias, têm tudo a ver com a auto-organização, que é a substância da vida,” afirmou Helena.
Esse movimento cíclico auto-organizado pode ser interrompido ou atenuado de duas formas: Não permitindo um salto nos níveis de Fermi ou configurando uma resistência negativa.
“Isso pode ser obtido fazendo o eletrodo negativo do mesmo material que os íons positivos do eletrólito,” explicou Helena Braga. “Isso dá origem a um dispositivo que se autorrecarrega sem autociclagem – aumentando a energia armazenada nele -, em oposição à degradação natural do processo eletroquímico que faz com que a energia armazenada diminua pela dissipação de calor. Isso tem aplicações em todos os dispositivos de armazenamento de energia, como baterias e capacitores, e pode melhorar substancialmente sua autonomia.”
Artigo: Performance of a ferroelectric glass electrolyte in a self-charging electrochemical cell with negative capacitance and resistance
Autores: M. Helena Braga, J. E. Oliveira, A. J. Murchison, J. B. Goodenough
Revista: Applied Physics Reviews
Vol.: 7, 011406
DOI: 10.1063/1.5132841